1.10.09

Setúbal não é um deserto mas ainda não perdemos a esperança: camelos não faltam.

De rajada, três artigos no "Diário de Notícias" que falam de Setúbal. Como sempre, de Setúbal no seu melhor: o empreendedorismo imobiliário.

I. Sobre a investigação acerca da morte de uns sobreiros decidida por um ministro do "ambiente", coadjuvado por um ministro da "agricultura". Não acredita? Leia.

Caso que envolve Sócrates foi arquivado e reaberto

Em 2001, um despacho de José Sócrates, como ministro do Ambiente, e de Capulas Santos, da Agricultura, permitiu o abate de sobreiros para uma urbanização. O caso está em investigação há seis anos sem resultados objectivos, mas com muitas peripécias pelo meio. Já foi arquivado, mas o director do DIAP de Évora mandou reabri-lo em 2008

Parado, dividido, arquivado e reaberto. Esta é, em síntese, a história da investigação ao chamado caso Vale da Rosa ou Nova Setúbal, que envolve um despacho de José Sócrates que permitiu em 2001 o abate de sobreiros para a construção de uma urbanização em Setúbal. Iniciada em 2003 no Ministério Público daquela cidade, a investigação esteve, durante um ano, a correr em dois departamentos da Polícia Judiciária. Só ao fim daquele tempo é que um procurador se apercebeu de que havia dois inquéritos sobre o mesmo assunto, um titulado por si, o outro pela colega do lado.

As peripécias da investigação do caso Vale da Rosa (ver pergunta e resposta) estão à vista nos, apenas, quatro volumes que o processo (consultado pelo DN esta semana no DIAP de Évora) acumulou em seis anos. Após a entrada da denúncia inicial, em Março de 2003, um procurador do MP de Setúbal remeteu-a para a ex- Direcção Central de Investigação da Corrupção e da Criminalidade Económica e Financeira (DCICCEF) da PJ situada em Lisboa. Ao mesmo tempo, o Departamento da PJ de Setúbal também tinha uma investigação em curso sobre o mesmo assunto. E assim ficou.

Só em Janeiro de 2004, é que o procurador que enviou a investigação para Lisboa se apercebeu que, afinal, havia outra: "Só agora me foi dado a conhecer que relativamente aos factos ilícitos participados corre já termos o (processo) 422/03.5, cuja investigação está a ser levada a cabo pelo Departamento de Investigação Criminal de Setúbal". Resultado: o magistrado enviou um ofício para a DCICCEF, ordenando a remessa desta investigação para Setúbal, a fim de ser incorporada na outra.

Este pára-arranca levou a que só a 2 de Novembro de 2004 é que Francisco Ferreira, então presidente da associação ambientalista Quercus que também denunciou publicamente o assunto, fosse ouvido como testemunha para concretizar alguns dos factos denunciados. Ainda durante este mês, o procurador-distrital de Évora decide retirar o caso do MP de Setúbal e transferi-lo para o Departamento de Investigação e Acção Penal de Évora (DIAP). Isto após o director deste departamento, Alcides Rodrigues, ter feito um parecer, considerando ter sido "um erro" retirar "a investigação da área da DCICCEF, naturalmente mais vocacionada para a análise destas matérias".

Até Agosto de 2008, a investigação prosseguiu aos solavancos, com pequenas descobertas a nível local, como transferências de dinheiro feitas por Emídio Catum, um dos sócios da empresa Pluripar que estava no centro do negócio, para Mata-Cáceres, antigo presidente da Câmara de Setúbal (ver texto nesta página). De fora ficou qualquer diligência para se apurar se houve, por exemplo, tráfico de influências, para o despacho de Outubro de 2001 de José Sócrates e Capoulas Santos que permitiu o abate de sobreiros. Um procurador do DIAP de Évora decidiu arquivar o caso. Mas o director do DIAP não concordou com a decisão, ordenando a sua reabertura, dizendo que "a investigação não realizou todas as diligências que se impunham para confirmar ou dissipar as suspeitas". O caso mantém-se em aberto.


II. Sobre o Vale da Rosa. Ou devia ser "Vale dos Rosas"? Por que não, para ser democrático, dos laranjas? E como esquecer o contributo inestimável dos encarnados? a versão governamental, na oposição eram contra...

P&R

O que é o caso Vale da Rosa ou Nova Setúbal?

Trata-se de um processo judicial que investiga um negócio feito entre o Vitória de Setúbal (VFC), a câmara e a Pluripar, uma empresa do ramo da construção civil. O negócio passa pela construção de um novo estádio para o VFC no Vale da Rosa, juntamente com uma urbanização, ficando a Pluripar com o direito de exploração de superfície por 90 anos do local onde se encontra o actual estádio.

Qual o papel de José Sócrates?

À data dos factos, era o ministro do Ambiente. Como no Vale da Rosa existia um montado, foi preciso uma declaração de imprescindível utilidade pública - emitida por Sócrates e Capoulas Santos, como ministro da Agricultura - para o projecto avançar e se proceder ao abate de sobreiros.

O que vai acontecer à investigação?

Apesar de ter sido reaberta, muito provavelmente será arquivada. Os factos remontam a 2001. Passados estes anos, há o risco de eventuais crimes estarem prescritos, sendo que a recolha de prova é, nesta altura, muito difícil ou impossível.


III. Não acredito... só pode ser mentira.

Transferências suspeitas para Mata Cáceres

por C.R.L.

Emídio Catum, um dos sócios da Pluripar, empresa que está no centro do negócio do Vale da Rosa, emprestou directamente dinheiro e avalizou junto de dois bancos empréstimos pessoais de Mata Cáceres, antigo presidente da Câmara de Setúbal eleito pelo PS, que impulsionou o projecto que ainda se encontra em investigação. Mata Cáceres só em Julho deste ano é que foi constituído arguido.

De acordo com elementos recolhidos pela investigação, que o DN consultou, há registos de uma transferência de 75 mil euros de uma conta de Emídio Catum para Mata Cáceres. Assim como o empresário está como avalista em dois empréstimos contraídos pelo ex-autarca, um de 225 mil euros no BPN, outro de 200 mil no BES. Quando foi questionado na qualidade de testemunha, Mata Cáceres afirmou que tais operações bancárias foram realizadas tendo em conta a "degradação" do seu património, salientando que as mesmas ocorreram após ter saído da autarquia. Quanto a garantias dadas a Emídio Catum, o ex-autarca disse que apenas lhe deu a sua "palavra", acrescentando que do empréstimo de 75 mil euros já tinha pago 35 mil.

Esta explicação convenceu um procurador do DIAP de Évora, que arquivou o caso, mas não teve o mesmo efeito no director do departamento, Alcides Rodrigues, que ordenou a sua reabertura. Dizendo que era preciso apurar quais "as verdadeiras motivações" que estiveram na base de tais operações. "A experiência moral da vida ensina-nos que ninguém empresta dinheiro sem ter em vista retirar daí uma vantagem sem assegurar garantias."

"O comportamento solidário e altruísta que o ex-presidente da Câmara quis fazer ter existido só acontece em situações excepcionais, baseadas em relações profundas, sustentadas por fortes laços familiares ou afectivos", escreveu o director do DIAP.

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