20.2.10

Tragédia na Madeira. Os mortos valeram a pena?

Liguei a televisão distraidamente e vejo água, muita água a escorrer encostas abaixo, ruas alagadas e carros destruídos. Com mais atenção, apercebo-me que é um directo da RTP-Madeira, "o temporal bateu-lhes forte", pensei. Depois, vejo polícias impotentes a olharem para um centro comercial onde a água entrava pelas garagens e fazia reféns algumas dezenas de pessoas, nas varandas do edifício tentava-se usar o telemóvel... mais à frente, valas de drenagem plenas de lama saltando e transbordando, abrindo caminho furiosa por entre os muros de betão das valas. Haverá cinco mortos, oiço. Fico estupefacto e pergunto a mim próprio como é possível uma coisa daquelas. Entretanto o canal televisivo decide repetir as imagens. Desligo a televisão.

Mais tarde, abro a edição online do "Público" e vejo abismado que a contabilidade das vítimas já vai em 32 mortos. Um balanço humano terrível. O que já era uma ocorrência impressionante transforma-se numa tragédia e na urgência de ajuda por parte dos restantes compatriotas.

Lembrei-me, entretanto, de outras cheias. Em Lisboa, penso que decorria o ano de 1967, era eu puto. Na altura falava-se à boca calada de muitos mortos, mas os jornais e a televisão não diziam nada. Os mortos eram o testemunho de uma cidade que não estava preparada e a ditadura não queria que se soubesse da sua incompetência.

Agora, 43 anos depois e em democracia, os telejornais mostram, repetem e voltam a repetir as imagens espectaculares da violência dos elementos. Eu não quero que abusem da estética da destruição das coisas e das pessoas, eu exijo que façam uma única pergunta a quem manda naquelas ruas e nos edifícios construídos sobre os leitos de cheias: "Valeu a pena?"

Actualização às 22h15:

À hora do jantar, alguém coloca a TV na SIC-Notícias, oiço um especialista convidado pela SIC a afirmar telefonicamente que o modelo de urbanismo na Madeira não se enquadra em nenhum modelo que possa obstar ao que vem ocorrendo ciclicamente na ilha a cada temporal. Não sou especialista, mas tenho um pressentimento, e era capaz de jurar que já ouvi outros especialistas a dizerem o contrário. O jornalismo impõe que se confrontem verdades, como isso não aconteceu a mensagem que passou foi a de que os mortos e a destruição são inevitáveis.
O noticiário acabou com o (inevitável) "vamos rever as imagens da destruição na Madeira". Com banda sonora e tudo... SIC-Nojo.

18.2.10

"Quem se mete com o PS, leva!"

Alguma semanas depois de Manuel Alegre ter apresentado a sua mais que provável candidatura presidencial, e depois da direcção do Bloco de Esquerda se ter apresentado na bilheteira antes sequer do filme estar em cartaz, ao que consta para desagrado de grande parte do seu "agregado familiar", eis que aparece uma nova candidatura à presidência, desta feita a de Fernando Nobre, o muito mediático fundador da AMI.

Para os que não lêem o "casting" que acompanha os programas eleitorais, Fernando Nobre foi mandatário nacional da vitoriosa campanha europeia do Bloco de Esquerda, o que à partida gerará simpatias em relação à sua candidatura entre o eleitorado "bloquista" e, por via disso, constituirá uma dor de cabeça para a direcção do bloco, ameaçada de ver o seu quinhão eleitoral dividido entre a "união das esquerdas" de Alegre e a mensagem de "Cidadania" do médico.
O pior de tudo isto é que nenhum dos dois candidatos de esquerda que se apresentam a concurso tem um mote que tenha algo a ver com o programa clássico da esquerda que deu origem ao bloco. Isto é, na fase actual de derrotas continuadas do campo dos trabalhadores, nenhuma das candidaturas representa esperança mais duradoura que os poucos segundos que se demora a colocar o voto na urna. A Esquerda da resistência social estará órfã quando abrir a caça ao voto.

Fernando Nobre não tem, suponho, curriculum partidário. Uma vantagem, a do "apartidarismo", tendo em conta que o povo está cansado da barafunda mediática e do tráfico político-económico, e não enxerga alternativas porque a agenda da comunicação social alimenta a confusão e só lhes dá o "prato da casa".
Fernando Nobre estará em estado e graça, pelo menos até os cavaquistas pressentirem alguma ameaça e servirem-se dos seus órgãos de informação para dizerem que o médico não tem "preparação técnica" nem "estofo" para a coisa. Um veneno que a candidatura "bloquista" de Alegre já provou. Esperemos até Balsemão carregar no botão e veremos os comentários dos cobridores de eleições da SIC. Acreditem, é gente capaz de ilusionismo puro, conseguem fazer desaparecer uns e aparecer outros como por artes mágicas. Lembremo-nos, da última vez cumpriram a profecia de Rangel: elegeram um presidente da república.

Continuando, o médico da AMI colherá em vários eleitorados e, cereja em cima do bolo, vai partir o eleitorado do Bloco de Esquerda, pelo menos o que se mudou do Largo do Rato para a Rua da Palma... numa consequência vice-versa agradável ao PS.
"Vice-versa" é exactamente aquilo que a direcção do Bloco de Esquerda tentou impedir ao apoiar apressadamente a candidatura de Manuel Alegre, atalho vitorioso de uma das suas tendências mais virada para a "alta política" e a mediatização do que para os campos tradicionais de labuta onde a esquerda colhe vitórias e apanha desilusões.

Com Alegre, o Bloco conseguiu "entalar" o PS durante uma semana. Depois, a máquina de propaganda socratista reagiu, para sossego das suas hostes mais inveteradas e para gáudio da comunicação social que gosta de lugares-comuns, e sentenciou: "O Alegre é o candidato do Bloco."

Alegre não gostou do "handicap" e tem passado os últimos tempos a procurar convencer a comunicação social do contrário do lugar-comum. Não é o candidato do Bloco de Esquerda e, para o provar, retoma um discurso que repugnaria àqueles que votaram em Francisco Louçã nas últimas presidenciais. Neste particular, o Bloco de Esquerda faz lembrar aquele texugo dos desenhos animados, o "Pierre Le Pew", um pinga-amor que está apaixonado por uma gata a quem o seu cheiro repugna. O cheiro do "radicalismo", uma coisa de que o Bloco de Esquerda tem a fama mas de que, por decisão própria, não tem o proveito.

E o chantilli em cima da cereja em cima do bolo: ao que consta, à candidatura anunciada de Fernando Nobre não é estranha a entrada em cena da influência de personagens ligadas à "ala soarista" do PS, agastadas pela "trapada" que o seu partido tem vindo a levar e pela incapacidade dos socratistas fazerem algo de jeito na questão senão produzirem "sound bites" - versão inglesa de "bocas para a comunicação social preguiçosa reproduzir de forma acéfala".
Isto é, responderam ao apoio do Bloco a Alegre numa moeda parecida, a modos de que "foice em seara alheia se paga". "Quem se mete com o PS, leva", dizia o outro da empresa oficial das obras nacionais. Não foi à toa.

No meio do diz que diz e faz o contrário do que se diz à Esquerda, o PCP mantém-se calado, preparando o seu candidato para "marcar posição". Ninguém o pode criticar, já que ninguém o terá convidado para estes jogos florais. Além disso, é sabido que não é seu hábito participar em festas que não sejam organizadas por si. E, ainda por cima, a dieta de sapos pressupõe uma preparação antecipada do estômago. Tem uma vantagem esta sua atitude que passa por cautelosa, permite-lhe espaço de manobra e não se expõe a ejaculações precoces mediáticas como vem sendo hábito lá pelos lados do Bloco de Esquerda.

16.2.10

Mais um "craque" na Europa

As surpresas de Bruxelas não acabam, já não é a primeira vez que personalidades que por cá não deram particulares provas de competência são abraçadas entusiasticamente pela clique europeia para gáudio dos comentadores nacional-patrioteiros para quem o Cristiano Ronaldo mesmo que faça um jogo de merda é sempre o melhor.

Todavia, se o moço da Madeira é bom a dar pontapés na bola o que o faz ser respeitado até pelas defesas adversárias, não se poderá dizer o mesmo de algumas figuras que "exportámos" para o o centro da constelação política europeia.

A escolha de um governante que se envolveu na mascarada da guerra do Iraque e que bateu em retirada perante as dificuldades governamentais pátrias que jurou debelar, como aconteceu com Durão Barroso, não foi a modos que desprestigiante para um areópago que pretende ter os melhores dos melhores?
E agora, a possibilidade cada vez maior de Vítor Constâncio, um "guarda-redes frangueiro" no tocante às fintas dos especuladores nacionais, pago a peso de ouro e com a balança equilibrada pela incompetência da sua vigilância, ir para vice do banco europeu... Ninguém lá pelas europas sabe do ocorrido? Da sua capacidade em ser "fintado"? Sabem, mas não querem saber.

Para o eurocepticismo, mais uma prova de que "essa coisa da União Europeia" não é para levar muito a sério. É bem pior: é um sinal dos mais visíveis de que há uma união de interesses que em nome da Europa a inviabiliza.

(reeditado em 17-02-2010)

15.2.10

Portugal, SA

De acordo com o "Público":
Pelo menos 332 estabelecimentos com ensino secundário vão mudar de mãos.
Três quartos das escolas secundárias vão sair do património do Estado


O Estado não tem nenhum departamento que inventarie e, coordenado com as delegações regionais, saiba onde e quais as obras a fazer?
Não perspectiva, com os municípios, as necessidades futuras do Parque Escolar?
Pois bem, acabaram de passar um atestado de incompetência aos funcionários públicos do departamento respectivo... ou pretendem criar artificialmente excedentários na função pública.

A questão é simples: queremos que o Estado governe com eficiência o dinheiro dos nossos impostos, mantendo nós a capacidade de julgar o desempenho dos "administradores", isto é, do governo, através de eleições, ou deixaremos que os interesses do costume transfiram para empresas subordinadas à lógica fácil do lucro, onde só os accionistas votam - de acordo com os humores das suas carteiras?

Este governo do PS tem sido um autêntico camartelo destruidor de tudo o que é Público, ao ponto de tornar o PSD e o PP redundantes. Uma solução: Sócrates para a rua!
Ah, pois, a"instabilidade" - O que chamais a isto?! "Vem aí a direita"... - Vem?! Aprendei a conjugar verbos. Com uma esquerda assim não precisamos da direita para nada!

Com a direita no governo, a escavacar o que sobra deste pobre país pelos seus lobos esfaimados de tacho, talvez se cumpra o desejo ilusório de alguns de verem um PS de "Esquerda"(pelo menos até às próximas eleições) e, (tenhamos fé!) até mesmo os caniches da UGT a descobrirem "com apreensão", claro está, que há uma geração inteira mergulhada no trabalho escravo à conta do Código do Trabalho que ambos cozinharam. Mas amanhã não será a véspera desse dia.