(Artigo de Opinião publicado no jornal “O
Setubalense”)
A
Água é um Bem Essencial, não uma Mercadoria
Não foi há muitos
anos que a captação e distribuição de água no nosso concelho era
feita por serviços geridos pela Câmara Municipal, sob a
responsabilidade de um vereador com esse pelouro, representando um
governo local legitimado pelo voto popular nas eleições
autárquicas. Isto é, havia sempre a possibilidade dos cidadãos
interferirem na forma como um Bem Essencial tão importante como a
Água era gerido, através da Democracia: “Se não és competente
dá o lugar a outro”.
Entretanto, a
governação do PS que geriu este município durante 16 anos, decidiu
disfarçar a sua incompetência privatizando a água. Incompetência,
sim, porque só um incompetente entrega ao negócio a
responsabilidade de gerir um Bem Público que lhe foi confiado pelo
povo. Não? Então, ainda é mais grave: por mero interesse
partidário vendeu-se um Bem Essencial que pertencia à Cidade só
para fazer obras de fim de mandato. Saiu-se mal o PS, foi julgado e
perdeu as eleições. Mas nós perdemos ainda mais: a oportunidade de
julgar quem e como se governa a Água que abastece o concelho.
Agora, quando os
fantasmas das misérias do passado voltam a assombrar os lares,
quando a pobreza ultrapassa a vergonha e já invade as ruas de
Setúbal, quando há cada vez mais gente que já não tem dinheiro
para fazer face aos custos da luz e da água, o município está
incapaz de minorar o sofrimento desses cidadãos porque não tem o
domínio deste bem essencial. Mas isso não serve de desculpa para
não se tomar posição quando os direitos dos consumidores são
violentados.
A Água, de Recurso a
consumir com parcimónia e de acordo com as necessidades básicas,
transformou-se numa Mercadoria, uma fonte de negócio. Pode-se
consumir desregradamente, encher piscinas e lavar desalmadamente uma
frota automóvel, desde que se tenha dinheiro e, ao mesmo tempo,
conviver com a situação de que ela falte aos mais pobres para
cozinhar e fazer a higiene.
Assim, o regresso da
Água ao Controlo Público é uma exigência. Não para satisfazer
qualquer plano político ou clientela partidária, mas para garantir
aquilo que só não é uma evidência para quem tem a mente toldada
pelo grau-zero de sensibilidade social: o Direito à Água é um
Direito Básico a que todos os humanos devem ter acesso. Sim, um
Direito Humano, porque um “cliente” só tem direito àquilo que
pode pagar.
Acabei de me
posicionar em relação ao tema, debruçar-me-ei agora sobre uma
situação concreta:
Há poucos dias fiz
uma intervenção na Assembleia Municipal, em 28 de Setembro de 2012,
onde solicitei a intervenção da Sra. Presidente da Câmara ( por
impedimento desta, na pessoa do vereador André Martins) no sentido
de esclarecer algumas situações que se referem à forma como a
empresa Águas do Sado vem tratando os consumidores do nosso
concelho. Abro aspas e revelo o teor dessa intervenção:
“Chegou ao meu
conhecimento que a Águas do Sado, escudando-se numa lei que protege
os interesses das empresas quanto ao ritmo com que são feitas as
leituras dos contadores, está a confirmar os consumos a intervalos
de tempo cada vez mais distantes entre si.
Esclareço: não me
estou a referir a locais de consumo cuja leitura dos contadores tem
algum tipo de impedimento, arquitectónico ou outro.
O que está a
acontecer é que muitos cidadãos, quase todos de fracos recursos e
na maioria idosos, têm visto disparar o preço de um bem de primeira
necessidade, como é a água, para valores incomportáveis para o seu
orçamento mensal. Apenas porque, menos avisados, não telefonam ou
vão dar leitura mensal à empresa. Dito de outra forma, não se
substituem à obrigação do concessionário detentor do serviço de
abastecimento de águas de fazer a leitura dos contadores a
intervalos de tempo razoáveis.
E, o pior: esta
situação de lançar os consumos de vários meses numa só factura
tem como consequência directa a subida de escalão de consumo e o
aumento de todas as taxas a ele associadas. O que leva a uma pergunta
que não sou só eu que faço: estamos perante um “desfuncionamento”
ou expediente?
Para desfazer esta
dúvida, é minha obrigação solicitar-lhe:
- Que indague junto da
empresa Águas do Sado qual é periodicidade efectiva com que os seus
serviços estão a fazer as leituras dos contadores de água dos
consumidores;
- Que confirme, ou
desminta, junto daquela empresa, a informação que me chegou de que
a quantidade de funcionários a quem compete a leitura dos contadores
dos consumidores é cada vez menor e com áreas geográficas
atribuídas cada vez mais alargadas;
- E, finalmente, que
esclareça porque razão os valores de consumo de vários meses são
imputados numa única factura, como se de um único mês se tratasse,
sem se estabelecer uma média no cálculo dos escalões e taxas
associadas.”
Fecho as aspas. E
fico, como muita gente neste concelho, a aguardar explicações.
José Tavares da Silva,
Deputado municipal,
eleito pela lista do
Bloco de Esquerda
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